6 de maio de 2017

Três Almas por Dois Mil Reais

Parte I

Um carro cravado de balas cruzava a estrada que sai da cidade. O motorista sem fôlego atrás do volante, uma mochila cheia de dinheiro ao seu lado. "Jogo nesse matagal e volto amanhã, ninguém toca nela", ele pensou.

As sirenes da polícia logo atrás. Pé no acelerador, penetrando a escuridão da noite, o homem tinha sua camiseta em vermelho, sangue de família.

Mas não acordaram o povo daquela casa. Era uma senhora, seu cachorro e dois inquilinos: rapaz e moça, protagonistas desta pesada história.

No quintal, uma mochila com dois mil reais. No céu, o sol se levantava.

O rapaz tinha 29 anos, um homem, moço no espírito e aparência. A moça era mais nova, 24 anos, inteligente mas reservada. Divididos por uma parede, iguais em pensamento, fora deste mundo.

Sebastião era o nome dele, vindo do interior, ganhando a vida na capital. Era o caçula de cinco irmãos, todos formados, trabalhadores, sempre rebaixaram Sebastião. Mas ele nunca desistiu.

Fazia bicos de segurança, ganhava pouco. Queria algo maior, mas a vida parecia querer abaixá-lo. Foi quando conheceu Sara, inquilinos da senhora dona de pensão, que não é muito importante nesta história.

Sara era sonhadora, mas nunca saiu do lugar. Trabalha no pior dos empregos: doméstica. Era humilhada por seus patrões, mas sempre foi feliz.

Sebastião nunca havia dito uma palavra para sua vizinha, que também não ligava muito para ele. Mas o dois ainda sonhavam em ir embora, em viver só, longe daquele mundo, das pessoas que os faziam mal...

A situação mudou quando Sebastião achou a mochila cheia de dinheiro.

Na noite passada tiros foram ouvidos, mas não eram fogos de artifício. O mercado foi assaltado, todo o dinheiro levado. Um dos policiais conseguiu acertar um ladrão na fuga, mas seu comparsa fugiu.

"Se me pegaram, não pegam o dinheiro", pensou o ladrão furioso.

Então lá jogou o dinheiro, naquele monte de mato. E Sebastião por acaso o achou enquanto caminhava pelo quintal. Era uma mochila negra, velha. Havia sangue em um lado da mochila, mas já estava seco. Dois mil reais em notas de dez e cem.

O coração de Sebastião aqueceu, mas ele não contou a ninguém.

"A polícia continua as buscas pelo bandido que assaltou um mercado na cidade" diziam os rádios, Sebastião assistindo, "segundo as autoridades, o nome dele é Carlos e seu irmão, Israel, foi morto durante uma troca de tiro logo depois do assalto".

Parte II

Sebastião, deitado em sua cama, olhava para a lâmpada no teto. Em cima da sua mesa havia o dinheiro. Ele sabia que aquilo devia ter um propósito em sua vida, mas não tinha certeza do que era.

Do outro lado, Sara tentava dormir, mas os mosquitos, a escuridão e o silêncio não deixam, além do sentimento de solidão que a perseguia.

Foi na manhã seguinte que Sebastião arrumou suas coisas. "Pra onde vai?" perguntou a senhora dona da pensão. "Vou para minha cidade natal, vou recomeçar lá, adeus", ele respondeu. Algumas roupas, o dinheiro e um revólver velho era o que ele levava.

Sara, da porta de sua casa, observava aquele homem indo embora. "Ele é tão determinado", ela pensou, "tenho vivido por tantos meses ao seu lado e nunca percebi isso".

O ônibus já estava chegando, Sebastião se preparava para embarcar. "Espera!", ele ouviu vindo de trás. "Qual é seu nome?", Sara perguntou, mas Sebastião não respondeu, sorriu e a abraçou.

E entraram no ônibus juntos.

Parte III

Esta é a história do ladrão Carlos e o que aconteceu a ele:

Eram dois irmãos: Carlos e Israel. Quatro anos de diferença. Nascidos na pobreza, criados na criminalidade, o bairro mais pobre da cidade era o lar deles. Carlos era mais novo mas não era menos esperto, na maioria das vezes ele orquestrava os crimes.

Mas Israel era mais adorado pelo pai, pobre garoto, leve paralisia cerebral. Muitas vezes era abusado pelo irmão.

Um assalto em um mercado no centro deu um fim à vida de Israel, dois tiros nas costas o derrubaram. Mas Carlos escapou e com uma reputação inteira de crimes, não deixaria que os policiais pegassem de volta o seu roubo.

Correu por quilômetros. Gasolina acabada, se meteu nas matas, conhecia o caminho até a casa do seu amigos Jonas, que o ajudava em horas "difíceis".

Logo a polícia havia o perdido. Mas ele queria seu dinheiro de volta, e ele sabia onde havia o jogado.

Parte IV

Não eram namorados, nem amigos, apenas companheiros em um mundo de incertezas. Lutavam para contar do dinheiro, o ônibus balançava severamente.

Sebastião logo estava em casa, morava sozinho, irmãos moravam em outra cidade. Sara apenas se deitou. Eles pouco se falavam, mal se olhavam, mas eles estavam bem. Não se amavam, mas se admiravam.

"O dono deste dinheiro deve estar bem longe...", sussurrou Sebastião.

Mas assim que a noite caiu e o mundo se calou, sons e barulhos eram ouvidos ao redor da casa, algumas vezes vidro quebrado. Algum gato ou vizinho inquieto, eles pensaram. Era algo muito pior.

O terror só veio de manhã... numa janela do prédio vizinho ele se escondia. O tiro foi na perna, acerto em cheio, sangue, gritos, dor.

Mas tiros foram disparados, mas nenhum acertou.

Sebastião veio resgatá-la, Sara perdia muito sangue. Percebeu uma janela quebrada no carro, mas achou que um tiro a tinha acertado. Se apressou e acelerou com tudo.

"Vai ficar tudo bem, ele dizia", Sebastião dizia. "Ele vai nos matar antes de chegarmos em um hospital", ele pensou rápido, "ninguém vai estragar minha vida, não mais!".

Da janela do prédio, Carlos tudo via. O olhar maligno nos seus olhos, a lembrança do pobre irmão, que nunca mais verá, o desejo de vingança, "aquele dinheiro é meu!".

Roubou um carro, o primeiro que viu e acelerou o máximo. Tirou um pequeno dispositivo de seu bolso, uma luz vermelha que mal piscava, enquanto mais acelerava, mais rápido piscava.

No carro de Sebastião, Sara gemia, já estava branca. Um barulho, porta-luvas. "Que diabos é isso?", Sebastião pegou aquele objeto escuro... uma luz piscava constantemente... ele estava chegando mais perto. Pensou em destruir o aparelho de rastreamento com o revólver, mas só havia uma bala.

"Pra onde vamos?!", disse Sara, "Vamos sair do centro! Vou matar esse desgraçado!", respondeu Sebastião.

Parte V

Já podia ver Carlos no retrovisor, o rosto assassino. Sara na beira do desmaio.

Era um terreno baldio, um pequeno morro, havia um boa vista de um parte da cidade. A vegetação crescia alta ali. O carro parou. 

Sebastião saiu do carro, canhão na mão, coração a mil. Sara desacordada.

O outro carro parou.

Carlos, escopeta na mão, apontando a sua arma.

"Me dê o dinheiro"

"Não"

"Dê, ou atiro"

"Não"

"E quem é você? Um qualquer que acabou pegando o dinheiro que eu roubei. Você não tem nada a ver com essa história, rapaz!", disse Carlos.

"Eu tenho esperança, você vive um pesadelo!", Sebastião apontou o revólver.

"Eu sacrifiquei meu irmão para isso! Eu amava ele! Sim, amava!"

"E eu sacrifiquei minha amiga, minha única amiga!", Sebastião disse, baixando sua arma e erguendo os braços, "me mata, se tiver coragem!"

E Carlos atirou, e ele caiu, barriga aberta, rosto no chão, sangue e terra.

Carlos caiu de joelhos, mas conseguiu se manter em pé depois. Dentro do carro estava uma mulher morta banhada em sangue mas nenhuma mochila.

E ele pôs a mão na cabeça, e chorou por seu tesouro, sentado no banco, perdido.

Mas se virou e viu Sebastião, em pé, mão na barriga, sangue até os pés, revólver em punho Uma bala.

Mirou no tanque de gasolina.

Parte VI

A mulher ligou o rádio, como sempre fazia no meio-dia.

"Foi como uma bomba", disse o âncora do jornal, "coisa de cinema. Vizinhos disseram ter ouvido o barulho pela manhã, mas a polícia só chegou lá há poucas horas. Segundo o sargento Dias, da polícia militar, foi encontrado um corpo carbonizado ao lado de um carro, também carbonizado. Dentro do carro, o que era o corpo de um homem e uma mulher. Também segundo o sargento, no porta-malas do veículo havia uma mochila contendo dois mil reais."

FIM

1 de maio de 2017

Sobre o filme La La Land



Este é um filme fenomenal. Um pianista e uma atriz se conhecem em Los Angeles e vivem uma aventura emocionante cheia de música e dança.

Emma Stone e Ryan Gosling são mesmo dois grandes atores, os seus personagens (Sebastian e Mia, respectivamente) são adoráveis. A fotografia é ótima também, realça a harmonia dos dois. Não tenho palavras para descrever o quão lindos sãos os números musicais presentes em La La Land, principalmente Another Day of Sun e City of Stars.

Outro ponto bonito filme também é a coloração, que é vívida e logo se observa no começo do filme. Parece que ao assistir embarcamos em um mundo de cor, o mundo dos artistas de Los Angeles.

O final é emocionante, e até triste, em um ponto que estamos tão conectados e ligados aos nossos personagens. Mia e Sebastian são praticamente os únicos personagens de grande importância, mas não temos nada a reclamar.

É triste saber que o filme não foi o vencedor no 89th Academy Awards, tendo o prêmio de Best Picture roubado por Moonlight.

Está aí um filme que será lembrado por muito tempo. Uma obra de verdade, com espírito, cheia de emoção. Poucos filmes existem assim hoje.