Ouço um barulho vindo da minha cozinha. O pior de tudo é que eu moro
sozinho. Eu sabia que esse bairro era perigoso. Levanto-me e pego meu porrete, sempre guardado debaixo de minha cama. Olho para o relógio, são quatro horas da madrugada. Que ladrão esperto, escolhendo a melhor hora para entrar nas casas.
Avanço pelo corredor erguendo minha arma. Passos leves. Ainda consigo ouvir barulhos vindos da cozinha. Posso
ouvir minha geladeira abrindo, alguém tinha gostado do seu conteúdo.
Chegando na cozinha vejo que as luzes estão apagada. Na verdade, pouco vejo.
Apenas ouço uma espécie de rosnar. A única fraca luz vem da geladeira e
posso ver a silhueta de alguém ou de algo.
Jesus. Não parece com uma pessoa. É uma criatura baixa, magra e estranha em todos os outros sentidos. Está comendo a macarronada que eu guardei do jantar.
Esse desgraçado, seja humano ou não, tinha ido longe demais longe de mais.
Ligo a luz e posso ver a criatura melhor. Credo! Parece um monstro vindo de alguma filme de terror. Sua pele é meio que cinzenta, seus
olhos são grandes e penetrantes. Não tem pelos e seus dentes são como presas.
Ela dá um grito alto que acho que chegou a acordar meu vizinho. Avanço
com meu porrete, mas ele joga a bacia cheia de macarrão em mim antes que eu possa avançar..
- Maldito! Vem cá!
Ele acha que pode fugir de mim! Dou três batidas na cabeça dele. Sorte
do desgraçado que eu não sou muito forte, se não teria esmagado seus
miolos ou seja lá o que ele tenha na cabeça.
- Pu favô... para... dói...
Eu estou ficando louco ou antes de eu conseguir dar uma quarta porrada aquele bicho falou? Agora ele conseguia dialogar. Estava
todo coitadinho. Quase senti pena.
- Você fala? - eu pergunto.
- Sim, mim fala. Num mata mim. Mim cum fomi.
- Que diabos é você?
Levanto meu bastão, pronto para desferir um ultimo golpe, rápido e
fatal. Mas a criatura aparentemente gostava de sua vida, o que me
surpreendeu.
- Pu favô, sinhô. Mata num. Mim fazê coisa pu sinhô. Mim trabaia pu sinhô.
Aquela ideia me pegou. Eu posso fazer algo com aquele bicho. Sei lá,
como estudá-lo, talvez mostrá-lo para alguém. Não se vê um monstrinho daqueles todos os dias revirando sua geladeira!
- Sério? O que você sabe fazer?
- Mim sabi limpá casa. Mim usa a lingua pá limpá sujeira. Mim comi sujeira. Mim sabi
cuzinhá e arrumá coisa. Num mata mim, pu favô. Disculpa, sinhô.
- Isso é interessante...
Afinal, olhando bem, essa coisa não parece tão má assim. Só está com
fome. Ele deve ter vindo da mata, como um animal selvagem que sentiu-se
atraído por minha casa.
Não sei se seria certo matá-lo. Talvez não fosse muito ético da minha parte, talvez ele tivesse uma alma?
- Você está realmente com fome? Aqui, tome essas duas maçãs - eu entrego as frutas à criatura.
- Ó! Obrigadu, sinhô!
- Agora saia daqui!
Ainda tem tempo de devorar as duas frutas, deixando o suco cair no chão.
Vejo ele sair correndo pelos fundos, ainda com a maçã na boca.
Poderia ser pior, poderia ter tentado me matar. Só estava com fome.
Espero que nunca mais volte, ou talvez eu não tenha mais tanta piedade.
***
Nada melhor do que acordar numa bela manhã de sábado como essa. Já que
eu não vou trabalhar, fico em casa assistindo filmes na minha poltrona,
acessando a internet e lendo livros interessantes.
Dou uma passada no mercado para comprar meu almoço, encontro alguns amigos, sinto o doce cheiro dos produtos. Até conheço uma nova caixa que o mercado contratou. O nome dela é
Denize, deve ser alguns anos mais nova do que eu. Mas é uma garota adorável. Até
me deu o seu número de telefone. Adoro dias de sábado.
Só pelas quatro da tarde eu saio para dar uma volta de bicicleta.
Durante minha, encontra senhora, Dona Cruz, uma vizinha minha, que me dá notícias alarmantes.
- Seu moço! - ela me chama - Tu soube da ultima?
- O que?
- Tão dizendo que tem um bicho, um monstro, entrando na casa do povo. Tu ouviu falar?
A criatura de ontem! Meu coração gelou. Caramba, esperava que
aquilo tivesse sido um sonho. Agora é mesmo um ladrãozinho infernal
invadindo a casa das pessoas.
- C-como? - gaguejo - Que tipo de bicho?
- Ah, tão dizendo que ele é baixo, escuro e anda quase nu.
- Quem viu ele?
- Ele entrou na casa da irmã da Lídia ontem a noite. E de madrugada o
Seu Jacques quase deu um tiro nele. O bicho anda procurando comida.
Não sei o que é, mas se eu ver ele eu mato com minha vassoura, ah, sim.
- Na verdade, Dona Cruz, eu também vi ele ontem.
- Verdade?
- Sim, eram quatro horas da madrugada. Eu quase matei ele com meu porrete, mas meio que fiquei com pena e dei duas maçãs. Ele parecia
estar com fome, não achei que fosse um monstro
- Meu filho! Tu devia ter arrancado as tripas do maldito! Não dê comida para ele que ele vai se viciar.
- Eu entendo, Dona Cruz. Próxima vez eu vou ver se pego ele.
Me despeço e saiu pedalando. Chego em uma trecho cercado de mato e fico
com medo de algo pular em cima de mim. Será que existem mais daqueles
bichos? Talvez sejam uma nova espécie, ou sei lá. Talvez seja uma experiência de laboratório que o governo anda realizando em segredo e que deu errado! Se for isso, sabe-se lá o que mais pode existir por aí e o que esses cientistas podem criar. Ou talvez seja um alienígena? Talvez tenha se perdido no nosso planeta ou tenha sido abandonado aqui. Ele me parece bastante estúpido, então pode ser uma criança da espécie deles. De qualquer forma, é assustador pensar nisso.
Chego em casa e não demoro a me jogar na cama. Mas antes de conseguir fechar os olhos, alguém
liga para mim. É a Denize, a caixa do mercado.
Temos uma boa conversa, ela pergunta se poderíamos nos encontrar. Eu
falo que sim e poderia na minha casa, amanhã de noite. Desligo, durmo e
tenho bons sonhos. Nada melhor que um encontro numa noite de domingo.
Mas meus sonhos são interrompidos por barulhos na minha maldita cozinha.
Como na noite passada. Jesus, eram duas horas da madrugada. Será que é
aquele insetinho Com certeza, e meu porrete de madeira iria revolver as
coisas.
Os barulhos cessam. Quando chego na cozinha, me deparo com o mesmo bicho, agora deitado na minha mesa, como se fosse uma cama!
- O que está fazendo aqui? Disse para ir embora! - eu grito ameaçando o animal com minha arma.
A criatura se assustada e cai da mesa, se debatendo no chão, chorando e implorando.
- Pu favô, sinhô. Num mata mim. Mim cum sono, mim cum frio. Lá fora faz friu. Aqui é quenti.
- Ontem à noite eu mandei você ir embora. Você é um ladrão! Não vou te
tolerar. Você tem andado roubando casas de outras pessoas no bairro, eu
sei disso.
- Mim num tem casa. Mim anda fazendu coisa ruim puquê mim num tem
ondi morá, nem ondi cumê. Se sinhô deixá mim ficá aqui, mim num faz
coisa ruim nunca mais.
Seus olhos tão grandes, quase pulando pra fora da cabeça. Novamente, eu
sinto pena do ser animalesco. Mas como não. Ele é selvagem, mas me lembra uma
criança, ingênua.
- Você não tem mesmo para onde ir? - eu pergunto.
- Num tenho, sinhô.
- Gostaria mesmo de ficar aqui? Qual é o seu nome? Vou te chamar de Mim. É
assim que você vive se chamando. Pode ficar aqui, Mim, por esta noite.
Amanhã vou ver o que faço contigo.
- Obrigadu, sinhô.
- Mas você vai dormir na minha despensa.
- D-dispensa? - diz a criatura gaguejando.
- É, é uma sala bem escura e apertada onde eu guardo lixo.
Arrasto Mim pelo chão como se fosse um saco cheio de estrume. O Mim
parece não resistir, mas também não está feliz. A minha escura e suja
despensa, bem apropriada para ele, é sua ultima parada. Amanhã ele não
terá vez.
***
Mim parece se manter bem calmo na sua cela, provavelmente dormindo.
Ótimo, agora posso acabar com ele durante seu sono. Durante o dia, tomei finalmente uma decisão final, a de eliminá-lo, apesar de toda empatia que eu sentia por ele. Foi bom conhecê-lo, mas agora é
hora. Uma ligação, porém, me para bem no momento que vou abrir a porta
com meu porrete levantado.
É Denize.
- Oi?
- Oi, Denize. Tudo bem?
- Tudo, Ricardo. Você sabe que o nosso encontro é hoje, né? - ela pergunta.
- Sim, claro!
- Espero que você tenha preparado algo bom pra mim.
- Como assim? - eu dou uma risada, desconcertado.
- Uma surpresa, sei lá. Primeiro encontro é assim.
Ela sorri e depois desligamos. Estou em apuros. O que faço agora? Ela parece ser bem exigente. Esse tipo de mulher me assusta. Acho que vou me dar mal, já que não tenho nenhum
qualidade. Quer dizer, eu tenho casa própria, mas não dirijo, nunca
terminei a faculdade e ainda sou feio como o Mim.
O que uma garota legal como aquela iria querer com um cara como eu? Eu precisava impressioná-la.
Espera um pouco...
Abro a porta com um empurrão. Mim está no
chão, deitado em posição fetal.
Dou um chute nele, um pontapé.
- Ah, sinhô! Mias costa, sinhô!
- Acorda, Mim. Preciso de você.
Aquela noite de domingo seria a mais estranha da minha vida.
- O que o s-sinhô qué qui mim faça?
- Olha, Mim, isso parece um tanto estranho, mas hoje à noite eu vou
receber uma garota aqui em casa e eu quero te usar para impressionar
ela, sabe?
- Mim qué ir embora, mim com medo!
Me levanto e abro a geladeira em um empurrão. Mostra um pedação de carne
para a criatura, que arregala os olhos como se fosse o precioso dele.
- Isso vai ser seu se você me ajudar.
***
Faz tempo que não me olho no espelho. Essa camiseta minha, esse penteado
maneiro (nem passei gel) e esses sapatos até que me deixaram legal.
Passo um litro de perfume em mim, abro um buraco na camada de ozônio com
o spray. Mas o que não se faz num encontro?
A porta abre e lá está ele: Mim, vestido para a ocasião.
É bizarro, mas eu consegui deixá-lo elegante, ou pelo menos algo perto
disso. Só precisei pedir emprestado as roupas do meu sobrinho Lucas. Mas
ficou bom.
São 19:48, o que quer dizer que Denize está chegando. A mesa está
pronta, eu estou pronto, o Mim está pronto. Até meu PC está pronto: apaguei todo o conteúdo "inapropriado" dele, caso Denize queira dar uma
olhada.
Mim está no meu quarto devorando um pedaço grande queijo que estava na
geladeira fazia um mês. Faltam cinco minutos para 20:00, mas já ouço o
carro parando lá fora. A maçaneta se mexe, a porta abre. Minhas pernas
estão congeladas.
- Senhor, aqui está sua pizza.
Alerta falso. Pelo menos agora tenho algo para comer e acalmar o estômago e a cabeça.
O entregador vai embora. Minutos se passam. Já são 20:03 e nada. A
Denize teria se atrasado? Sabia que eu deveria ter ido para a casa dela.
Mulheres nunca veem até nós, somos nós que devemos ir até elas.
Sinto meus olhos mais pesados conforme o tempo passa. Já são 20:10 e
nada. Já são 20:12 e o Mim continua comendo meu queijo. Já são 20:15 e
eu estou dormindo, estirando no sofá como um trapo sujo.
Aproveito para ter sonhos. Dessa vez eu estou numa praça de noite.
Denize está na minha frente, com aquela carinha de anjo dela. Estamos
quase nos beijando quando sinto uma facada nas minhas costas,
literalmente um facada. Me viro e lá está o desgraçado, mas não posso
acreditar. É Mim, sorrindo.
Aí eu acordo.
Posso ouvir um carro estacionando lá fora. Me levanto em um salto. Olho
no relógio e são 20:26. Dou uma arrumada nas minhas vestimentas, meu
cabelo.
Vou correndo até o meu quarto ver qual é a do Mim e o encontro dormindo
como um panda em cima da minha cama. Aquele queijo estava bem duro, até
para os dentes dele. Para não ter nenhuma confusão, tranco a porta.
Dane-se Mim, ela está chegando!
A porta se abre e lá está, minha deusa. Está vestida num lindo vestido
preto. Ela poderia ter escolhido algo melhor, como amarelo ou vermelho,
ficaria um contraste melhor com a pele dela... ah, dane-se.
- Você está ótima!
- Sério? - ela diz sorrindo, graciosamente.
- É... mas eu falo da sua aparência. Quer dizer, eu não conheço da sua saúde. - eu digo, sempre agindo como um retardado.
Ela ri e eu convido ela para se sentar. Até agora está tudo indo muito
bem! Conversamos sobre tudo. Ela está estudando psicologia, e eu estou
estudando ela.
Até agora, nada de Mim.
***
Mim acorda. Mim confusu. Ó, é! Sinhô Ricardo queria mia ajuda. Mim tem
que vê namorada de Ricardo. Pedaçu de queiju muito bom, mas muito duru!
Tento abrí a porta, mas tá fechada! Quem fechô? Será que foi o Ricardo? Por que ele faria issu?
Olho ao redô do quartu e veju uma janela aberta. Aberta! Possu escapá e mi encontrá com Ricardo e namurada!
Mas janela muito alta! Mim usá cadeira para subí e pulá. Caiu em cima de
lama. Quintal da casa de Ricardo é muito suju! Saiu correndu pela noiti
escura, sorti que ninguém mi vê.
***
- Quando eu era pequena eu gostava de fingir que era homem. - diz Denize.
- O que? Que merda é essa?
- É. Eu gostava de esconder meu cabelo e vestir as roupas do meu irmão. Aí eu andava pelas ruas batendo nos outros meninos.
Enquanto meu queixo se quebra ouvindo aquilo, ouço batidas na porta.
Batidas pesadas. Tenho que pedir licença, mas ainda saio ganhando por
não ter mais que ouvir aquela história.
Abro a porta e lá está meu amiguinho Mim! Cheio de lama e lodo, parece
meu tio Jaílson. Ele escapou! Eu deixei a janela aberta. Nossa, eu não
sabia que meu quintal era tão sujo.
- O que está fazendo aqui? Você está horrível! - sussurro.
- Mim preso em quarto, mas Mim escapar!
- Sim, mas agora é tarde.
Saio para fora e fecho a porta, na esperança que Denize não perceba a conversa.
- Faz o seguinte: no quintal tem uma torneira que eu uso para aguar as
plantas. Tire suas roupas e se molhe lá. Depois entre de volta no meu
quarto pela janela e pego outras roupas. Mas pegue roupas bonitas, nada
exagerado! Tenha bom gosto. Agora vá!
O pequeno Mim desaparece na escuridão, rumando o meu quintal. A vida
dele deve ser horrível. Entre de volta em casa e lá está meu anjo
sorrindo, um tanto que desconcertada. Parece até assustada. Mas quem
deveria estar assustado sou eu, ora, depois de ouvir as "brincadeiras"
de infância dela.
- Com quem você estava falando? - ela pergunta.
- Com o entregador de pizza. Ele veio pegar o troco.
- Mas eu não vi nenhuma moto lá fora...
- Ele anda de pé por aí entregando pizza. A pizzaria é aqui perto.
Sento-me, ainda com uma dor de cabeça. A menina olha para mim, não sei
pensando o que. Mas eu estava preocupado com o e.t. no meu quarto.
Peço licença de novo e vou até meu quarto. Abro a porta e vejo Mim dentro de um vestido. Pelo menos ele está limpinho!
- Eu encontrei rôpa boa pa mim. - ele diz.
- Mim, essas são roupas da minha irmã. Ele tá de férias e deixou elas aqui.
- Mim gostar da cor, mim gostar de rosa! Mim pronto. Mim quer aquele pedaço de carne! Ricardo prometeu!
- Tá bom, tá bom. Que merda. Vamos lá. Mas não faça vergonha!
São 20:50. Tem um bicho no meu quarto vestido de mulher e uma linda
garota me esperando na mesa. Eu vou mostrar esse bicho branco para essa
linda garota para ver a reação dela. Eu sou louco.
- Você parece muito ocupado, Ricardo. - Denize diz assim que eu apareço.
- Olha, Denize, eu tenho que te apresentar um amigo.
- Amigo?
- É. Eu sei que esse é nosso encontro, mas é um amigo muito legal. Você precisa ver.
- Tudo bem. - ela ri.
- Mim, pode vir!
Lá vinha o Mim. Naquele vestido rosa ridículo, como um travesti de outro
planeta. Aquela cara selvagem e perdida dele, até cômica. Seu caminhar
era atrapalhado. Até eu ria.
- Esse é Mim. - eu digo.
- Oi. Mim gostar de queijo. - diz Mim.
- Ual, esse é o seu amigo?
- É sim, é um pouco esquisito. Na verdade eu nem sei o que ele é.
Encontrei o Mim roubando minha geladeira no meu da madrugada dois dias
atrás. Eu na verdade vou matar ele mais tarde. Mas podem brincar agora.
Mim se senta na mesa, subindo na cadeira para ficar na nossa altura. Parece uma criança. Talvez seja.
Mas uma coisa estranha eu raparei: o jeito que Denize olha para Mim. Ela
está mais fascinada com a criatura do que comigo! Não posso acreditar.
- Então, Denize, você já viajou para o exterior alguma vez? - eu tento
começar. - Eu fui para Paris faz quatro anos. A comida de lá é horrível,
não acredite no que dizem. Franceses são uns nojentos.
Mim devora as frutas deixadas em cima da mesa como se fosse sua ultima refeição. Mas espera, é sua ultima refeição!
- Eu gostei do seu vestido, Mim. - diz Denize, me ignorando, para a minha surpresa.
- Brigadu. - ele responde.
- E você já foi à algum jogo da copa de 2014? Eu vi o 7x1 com o meu pai.
Ele ficou chorando por uma semana. - eu tento mudar de assunto.
Denize continua fixando os olhos em Mim, como se ele fosse seu namorado. O encontro agora parece ter seguido outro rumo.
- Ei, eu ainda estou aqui. Denize, esse é nosso encontro.
- Do que você está falando, Ricardo?
- Não me ignore! - eu grito, raivado.
- Não fale assim comigo! Mim consegue ser mais adorável do que você, mesmo falando pouco! - ela se levanta.
- Você ficou doida? - eu me levanto também. Mim parece um retardado olhando para os lados.
- Vamos, Mim, vamos embora. Esse idiota só vai te causar desgraça! - diz Denize.
- Não, Mim, fique comigo! Eu vou te dar o mais suculento pedaço de carne que existe. Tony Ramos vai ficar com inveja!
Mim, indeciso, olha de lá para cá com aquele olhar de cachorro
abandonado. Ele enfim se levanta e parece decidido entre uma garota
cuidadosa e uma maluco que vai matá-lo em alguns horas.
- Prefiru ficá com mulhé que não tranca nois nu quartu.
- Seu desgraçado! Traidor! Depois de tudo que passamos é isso que você faz? E o pedaço de friboi que eu vou te dar?
- Num queru. Mim gostá de Denize. Pareci tê gosto bom.
- Viu? Adeus, Ricardo.
Meu coração se parte vendo aquela cena. Meu futura namorada ficando com meu "melhor amigo" de outro mundo. É
daqueles momentos que bate uma tristeza em você. É quando você repensa
as coisas e vê que o que tu fez foi errado, tudo errado. As coisas
teriam sido melhor sem Mim, com certeza.
Vou para o meu quarto me deitar, esfriar a cabeça. Nem tiro as roupas.
Mas antes de me jogar na cama eu vejo um bilhete lá. Está escrito numa
caligrafia horrível, mas consigo entender algumas coisas.
Foi escrito por Mim, aparentemente.
"Mim qué grandi pedaçu de carni. Mim cum fomi. Ricardu é fio da mãe. Mim não gosta dele. E pedaçu de queiju nem ser tão bom. "
Sério eu não deveria ter me levantado naquela madrugada.
FIM.