Foi recentemente que passei por uma experiência terrível. Mas não foi porque eu passei por uma vergonha, ou me acidentei ou fui traumatizado de alguma forma. O que me deixou mal foi a ausência de qualquer acontecimento, ou seja, não aconteceu nada ontem, e isso é o problema.
Fui convidado uma segunda vez a um encontro semanal entre amigos. A propósito, é justamente esse o título da tertúlia discutida aqui, "Entre Amigos".
Então, como eu havia me divertido e me entretido na semana anterior em um evento carregado de recreio e desenfado, principalmente por conta do gentil e amigável anfitrião, um homem inteligente e alguém que prefiro manter anônimo, pus na cabeça que este novo episódio teria o mesmo bom peso.
Porém, havia me enganado. Era uma arapuca safada.
Tentarei relatar aqui os detalhes mais importantes do que aconteceu e a impressão que foi deixada em mim pela organização deste evento...
Essa reunião, supostamente entre amigos, havia sido marcada para acontecer em um bairro um pouco mais distante do que as vezes anteriores. Devo ressaltar que o sol já havia se escondido a essa hora. Assim sendo, em meu caminho a pé até o local, me esbarrei com um colega que cuidava de suas viagens e que, por bondade, decidiu me "caronar" até o meu destino (que também havia se tornado o seu).
Chegando ao recinto, uma aprazível casa afastada, me deparei com um grupo de lépidos jovens, se divertido em meio a musicalidades e brincadeiras, além, claro, de conversas banais.
Estavam todos sentados no alpendre e então eu vi que seria uma boa ideia copiá-los. Porém, devido aos nossos desiguais gostos e afinidades, achei difícil iniciar qualquer contato além de um "boa noite".
No início haviam poucas pessoas lá, mas passados vinte minutos, mais indivíduos chegavam e enchiam a alpendre da residência. A maioria eu conhecia, ou haviam sido colegas meus na escola ou eram amigos destes meus colegas.
Devo dizer que estes momentos foram angustiantes, tempo perdido de minha vida. Me encontrava lá eu, sentado, fitando o vazio e ocasionalmente os olhares de muitos estranhos. Constantemente checava as hora em meu relógio. Era puro ócio.
Enfim, foi quando o anfitrião anônimo, mencionado mais cedo, chegou que o "Entre Amigos" teve início.
E se antes já era ruim, só estava piorando.
Os convidados entraram numa sala de estar, não muito espaçosa, acho que todos ali podiam admitir isso. Logo notei a ausência de cadeiras, fora os dois sofás que viriam a ser ocupados por membros da "alta elite", assim me refiro aos instrumentistas, entre outros.
Enfim, sentei ao lado desse meu amigo sobre uma almofada em um canto apertado (meu amigo a minha direita, uma móvel a minha direita). Embora a almofada fosse confortável, eu me encontrava em uma posição difícil, como pode imaginar. A experiência, portanto, foi desagradável também fisicamente.
Depois de tentar me acomodar, começou a sessão de tortura que parecia interminável. Mais parecia um festival de música cristã, as piores músicas.
Na maioria dessas músicas, a "plateia" (nós) era encarregada de bater as palmas para que houvesse uma sequência rítmica. Porém, devido a meu desinteresse tanto pela música em si quanto pela mensagem passada por ela, chocava a palma de minha mão contra outra demonstrando um semblante de fastio.
Foram diversas dessas músicas, intercaladas por sermões.
A dança era parte essencial de alguma delas. Era incrível como esses jovens conseguem passar vergonha e se comportarem como idiotas. Me lembro agora que havia pouquíssima diferença entre alguns dos participantes em suas caóticas coreografias e as brincadeiras frenéticas da filha de três anos de um dos organizadores.
Uma delas eu decidi não participar de forma alguma. Não sei se chamo de dança, acho que "sucessão de pulos" seria um termo mais apropriado. De qualquer forma, não tive tempo para confirmar isso, pois me retirei da sala de estar antes que houvesse tempo de qualquer vergonha que eu pudesse passar ali.
Fiquei no alpendre por alguns minutos esperando aquela tolice acabar. Passando um tempo, fui chamado a retornar.
Todavia, em meu regresso, a esperança de uma boa tertúlia, ainda alimentada por meu espírito
dolorido, foi finalmente assassinada com uma porção de novas músicas sacais e um pregação que me deixou furioso.
Seria ótimo dedicar uma parte de meu discurso aqui a essa estúpida predica, que deixou uma péssima impressão.
O homem era um missionário, assim me foi dito. Tinha calças engraçadas, largas, como as de um palhaço, por isso dei o apelido de "Bufão" a ele.
Este Bufão portanto uma Bíblia tratava o seu rebanho como bobos. Talvez fossem, não vou discutir isso, não agora. Mas eu não me sinto bem com alguém me tratando dessa maneira, principalmente alguém com calças tão esquisitas...
Desculpem, precisei de um tempo para me recuperar de um ataque de risos. Só de me recordar do que aquele sujeito vestia para cobrir as suas pernas abre um sorriso em meu rosto.
Sem mais enrolações, o que esse missionário fez foi contar uma parábola bíblica. Agora não me recordo exatamente em qual parte da Bíblia ela estava, mas se referia ao sucesso que igrejas tinham ao serem erguidas sobre a boa vontade e esforço de homens cristãos, em contraste com o fracasso daquelas erguidas sobre preguiça e arrogância. Era algo entre essas palavras.
Esse extrovertido missionário fez brincadeiras que ofenderam minha inteligência e que fizeram seriamente questionar a existência de uma divindade superior e bondosa que permitiria algo assim acontecer.
É difícil explicar o motivo de eu odiar as coisas que esse homem falou com palavras que sejam de conhecimento pleno e comum, a vista de que isso tudo foi uma experiência bastante pessoal. Mas acho que já entenderam como a natureza do cristão dessa igreja, que não direi qual é, realmente é.
Essa pregação, e já me deu falar dela, pôs um fim a sessão dentro da sala de estar da casa. Depois dela se sucedeu apenas uma última prece por aqueles que eram desprovidos da palavras de Cristo, e havia bastante comoção no ar. Todos se deslocaram ao alpendre mais uma vez. A essa altura, já me dominava as ganas de dormir.
Foi uma surpresa ver que a hora do rango, usando aqui um termo vulgar, havia chegado. Esqueci de avisá-los que a fome e o sonho de comida gratuita e saborosa foi um dos motivos de minha ida, e não me envergonho de reconhecer isso, já que tertúlias carregadas de lanches são comuns e é sempre bom utilizar a nossa ânsia por alimentação como uma forma de transmitir carisma.
Como eu dizia, a comida, nada mais que bolos caseiros e sucos naturais, estava sendo servida. Porém, o meu apetite havia sumido, talvez por causa da experiência traumatizando que anulou qualquer emoção presente em mim.
Esperei para que alguma discussão intelectualmente elevada tivesse início ali na hora do rango, já que a comida sempre foi boa para destravar a língua. Porém, não houve nada. Esperei alguns minutos, mas as pessoas estavam indo embora.
Como estava sonolento e faminto (não tinha jantado, esperando algo de bom nessa reunião), decidi que seria bom dar o fora daquele local o quanto antes. E como meu amigo me azucrinava a cada segundo, me perguntando qual eram meus desejos, não me demorei a me juntar a ele e partir. Terminei a noite insultando alguns membros da fracassada tertúlia e de sua natureza patética na garupa da moto de meu amigo.
Voltei pra casa, e não esqueci tudo que aconteceu. Ainda não me esqueci o quão tedioso foi isso.
O que quero dizer com tudo isso aqui é que os cristão, especialmente os mais jovens, são tolos e não me atraem de forma alguma. Existe algo que faz eu ter um certo nojo por este povo, mas não chego a odiá-los. Alguns deles são boas pessoas.
A mentira e o disfarce deste "Entre Amigos" é que me enoja. Pensava eu que seria um encontro semanal sem caráter religioso, onde não haveria nenhuma pauta predeterminada, apenas uma tertúlia com a simples finalidades de criar, construir e fortalecer laços afetivos, ou talvez apenas conversar sobre assuntos construtivos.
Mas como eu já disse bem no começo do texto, era uma arapuca. O que toda religião quer é fabricar fiéis. Nada de errado com isso. Mas o que essa igreja fez foi criar uma armadilha, falando em minha língua, mentindo sobre a finalidade da reunião, para que eu pudesse ser "pego" e convertido ao cristianismo.
O pior mesmo é a linguagem que usam para transmitir a fé. Musicais? Danças bobas? Brincadeiras? Isso não tem peso, nem efeito, em mim. Para mim, religião, fé, espiritualidade, tudo isso é algo muito importante. Ora, é o destino definitivo da humanidade que está sendo discutido aqui, a razão de nossa existência, o motivo do todo. Não se pode resumir tudo isso a musiquinhas e essas outras bobagens. É algo sério para mim, e se vão tratar isso com essa linguagem sem gravidade, então eu não vou entender nada.
Sem falar que esse "Entre Amigos" é uma igreja das terças-feiras, um domingo alternativo e descontraído. Muitos, eu percebi, perdiam o tempo utilizando os smartphones e falando sobre futilidades. Esse é o povo que quer me converter.
Mas não fui convertido e nem serei.
Ofendi alguns aqui, mas não me importo. Algumas dessas pessoas são inteligentes e bem formadas, eu as respeito. Outras são como o Bufão, vestindo calças ridículas.
Foi um longo texto, e falei muita besteira, mas eu precisava falar.
Até.