8 de setembro de 2019

Beijo de Bruxa ou O Que Minha Esposa Faz nas Noites de Sábado


Neto era um detetive particular. Seu trabalho consistia em investigar pessoas. Não era incomum que ele trabalhassem com casos envolvendo supostas traições. Por isso ele não ficou surpreso quando Gerson, um homem de trinta e oito anos, um dia o telefonou com uma voz irritada querendo contratá-lo para investigar os paradeiros da esposa todo sábado a noite. Um encontro permitiu a Neto saber mais detalhes.

- Minha mulher se chama Marcia e está escondendo algo de mim. - disse Gerson.

- Traição? - perguntava Neto tirando uma caneta e um bloco de anotação do bolso.

- Acho que sim. E ela anda esquisita atualmente. É todo sábado a noite. A Marcia diz que "vai dar um passeio" e só volta tarde. Poxa, essa hora é a hora de relaxar, não de andar por aí... não é mesmo, detetive?

- Claro... - Neto anotava observações no seu bloquinho: sábado, noite, mulher louca.

Então o trabalho começou. Naquele sábado Neto ficou estacionado perto da casa do casal até bem de tarde. Quando era quase sete da noite ele ouviu uma movimentação e viu Marcia saindo de casa e entrando no carro e então indo embora. Neto foi logo atrás discreto como sempre para não alertar a mulher.

A jornada foi longa, cerca de vinte minutos. Para Neto parecia não ter fim. "Para onde essa mulher vai?", se perguntava o detetive.

Ficou mais estranho quando os dois foram saindo da cidade e ficando cada vez mais distantes de qualquer casa. Era pior porque era noite e o cenário era de escuridão. De repente a estada era de terra. Marcia parou na beira de uma mata. Saiu do carro. "Que diabos é isso?", pensou Neto.

Felizmente ela não havia suspeitado que era seguida. Neto havia mantido uma boa distância e tinha desligado os faróis. Ele pôde vê-la entrar na mata fechada sem nenhuma lanterna, como que se soubesse para onde ir. Neto não tinha opção, o seu trabalho era ir atrás dela.

A missão de ser discreto e rápido para não perdê-la de vista foi bem difícil para o detetive. Neto se arranhou muito naquela noite tentado abrir caminho pelo mato. Mas depois de bastante esforço ele viu uma clareira e havia uma fogueira acesa.

Coçando as feridas, Neto se instalou atrás de uns arbustos e observou aquela cena que ficava cada vez mais bizarra. Era uma dúzia de mulheres, algumas eram apenas mocinhas e outras eram já eram quase idosas. Estavam todas em volta da enorme fogueira que queimava no centro da clareira. Marcia as cumprimentou com abraços e beijos na bochecha. Não deu pra ouvir o que diziam antes de cada saudação, mas o detetive pôde ver que elas falavam algo toda vez.

O que aconteceu depois daí Neto nunca esqueceu. Todas as mulheres começaram a tirar suas roupas. Uma delas apareceu com um boneco sinistro feito de pano que lembrava um espantalho. Neto não conseguiu descrever bem. A figura era grudada a uma estaca e foi cravado no chão ali mesmo no pé da fogueira.

E então começou uma festa. Metade das mulheres começou a dançar em volta do fogo. A outra metade xingava o boneco de pano enquanto jogava pedras no pobre coitado.

Neto mal acreditava no que via. Era como uma reunião de bruxas. Vasculhava os bolsos quando percebeu que tinha esquecido o seu celular. Ficou pensando como alguém iria acreditar nele.
Quando virou a cabeça em direção à clareira, viu que a inquietante cerimônia continuava. Depois de alguns minutos ela finalmente cessou e as mulheres se acalmara. Uma delas, talvez a mais velha, começou um discurso.

- Em breve, minhas queridas irmãs, será o grande dia. Em breve consumiremos os homens em nossas vidas. Nossos maridos e namorados que tanto odiamos em breve sofrerão o nosso fogo. Em breve nos tornaremos monstros! - dizia a mulher para as outras.

E então todas se despediram com abraços e beijos na bochecha e começaram a se vestir. Neto viu que era hora de ir embora dali e tinha que ser rápido. Mais uma vez sentiu os galhos roçarem contra seu ombro já ferido enquanto corria apressado para chegar até seu carro antes de Marcia.

Quando olhou no relógio viu que eram dez horas da noite. Pisando fundo, chegou na casa de Gerson antes de sua esposa e foi contando a história toda para o homem que mal acreditava.

- Bruxas?

- Não exatamente. Sua esposa está metida em algum tipo de culto. - disse Neto, suando.

- Tem certeza? Isso é loucura! - disse Gerson sem acreditar.

- Tenho certeza, e ela e suas companheiras parecem odiar homens.

Mas não deu tempo de terminar seu relato. Marcia estava estacionando o carro. Neto se apressou e saiu pela janela. Foi embora e não dormiu direito naquela noite. O que ele não sabia é que aquela seria a última vez que falaria com Gerson.

Na manhã seguinte viu a notícia de seu desaparecimento. Não só o dele, mas de vários homens pela cidade. Quando ligou os pontos, Neto pôs as mãos na cabeça e arregalou os olhos.

Foi até a casa de Gerson mas e viu as viaturas estacionadas na frente e ouviu choros de dentro.

Com toda aquela situação, a única forma de se acalmar que encontrou foi tomando uma xícara de café no conforto de casa.

Enquanto bebia, o detetive pôde sentir as mãos frias e delicadas da namorada massageando seus ombros. O beijo suave dela em sua bochecha lembravam-no de algo...

- Bom dia, amor.

Neto pulou de susto e quase derramou o café.

- O que foi? Parece que viu um monstro - ela perguntou.

- Talvez, meu bem, talvez.

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